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quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A peculiar gestão de Meirelles no BC

Revista Época
qua , 24/11/2010 Paulo Moreira Leite
Geral, economia Tags: dilma, governo


A presença de Henrique Meirelles na presidência do Banco Central marcou uma etapa peculiar na gestão da economia brasileira.

Embora sua competência não possa ser colocada em questão, Meirelles não
chegou ao posto em função puramente de seus méritos técnicos mas para cumprir uma atuação política.

Hostilizado pelo mercado, que criou um ambiente de pesadelo em torno de sua vitória nas eleições de 2002, Lula abriu espaço no governo para um representante do grande capital financeiro, consumando um grande acordo entre um presidente de esquerda e um homem de confiança da elite financeira internacional.

O escolhido foi Meirelles, numa opção que, conforme o colunista Janio de Freitas, da Folha de S. Paulo, contou com apoio de Donna Hrinak, embaixadora dos Estados Unidos no Brasil antes de mudar-se para a iniciativa privada.

O pacto com as altas finanças funcionou. Durante sua permanencia no BC, o papel político de Meirelles era esse: atuar como uma âncora num governo petista, uma garantia de estabilidade num ambiente que, em seu estado natural, iria produzir temor entre grandes empresários e banqueiros.

Não há dúvida de que Meirelles soube cumprir seu papel político com eficiencia, contribuindo para gerar um ambiente de confiança externa nos fundamentos da economia do país. Em abril de 2010, quando pensava em deixar o posto para disputar um cargo eletivo, Lula mobilizou-se como pode até convencê-lo a ficar. Temia-se o óbvio: que uma saída repentina pudesse atrapalhar a campanha de Dilma Rousseff.

Em sua passagem pelo governo, registra-se um erro grave do BC. Foi em novembro de 2008. O mundo desabava, a economia brasileira chegou a cair para 13 pontos negativos mas, ainda assim, por orientação do Banco Central, o COPOM foi capaz de elevar a taxa de juros em nome de uma ameaça inflacionária que ninguém mais enxergava.

O preço da presença de Meirelles num cargo decisivo do governo foi outro, porém. Convencido de que seu governo não teria salvação fora do crescimento econômico, ao longo do mandato Lula tratou de oferecer com uma mão aquilo que Meirelles retirava com a outra, abrindo brechas para entregar, a preço barato, aquele dinheiro que a taxa de juros do BC manteve em patamares sempre elevados.

Foi assim que nasceram os financiamentos do BNDES a juros subsidiados, os estímulos ao crédito popular, os grandes financiamentos com recursos públicos. Havia algo de esquizofrenia nesse sistema mas não há dúvida de que funcionou, pelo menos durante os oito anos de governo Lula. A contrapartida, no plano econômico, eram distorções variadas. No planto político, o saldo eram duelos verbais frequentes entre Meirelles e Guido Mantega, que chegavam a trocar comentários ácidos mesmo em eventos públicos.

O ritual de partida de Meirelles foi marcado por um lance teatral de dois lados — e venceu quem tinha mais força política. Muito mais enfronhada nos debates econômicos do que seu antecessor e padrinho, Dilma tem suas convicções sobre política econômica — uma delas, de que os juros podem cair em prazos mais rápidos do que o fizeram nos últimos anos. Dilma nunca exibiu a mesma paciência de Lula para assistir à guerra interna da área econômica como simples espectadora. Há vários dias já havia dado sinais de que pretende dar uma direção à política economica, e não adminstrar entre visões tão diferentes.

Meirelles só poderia manter seu papel político à parte, acima do governo, caso recebesse poderes especiais da presidente a ser empossada em 1 de janeiro. Cobrou uma definição em público, com a postura de quem impõe condições para permanecer no posto. Viu que atravessou o sinal e Dilma não perdeu a oportunidade para retirá-lo do posto.


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